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Uma investigação da Alternactivia – Acção Pela Emancipação Social

Maputo, 15 de Julho de 2024 – Entre os dias 17 e 20 de junho, nos distritos de Mocubela, Maganja da Costa, Namacura e Quelimane, realizou-se o processo de consulta pública para apresentação dos estudos preliminares de impacto ambiental da actividade de mineração de areias pesadas em águas superficiais na província da Zambézia, no centro de Moçambique. Este estudo é parte do pedido de cinco licenças ambientais submetidas ao Ministério dos Recursos Minerais e Energia pela empresa Africa Ocean, visando explorar as águas superficiais da costa da Zambézia durante 20 anos, numa actividade mineira sem precedentes no país.

As consultas foram conduzidas por uma mesa composta pelo administrador distrital ou pelo secretário permanente de cada distrito, representante da empresa proponente e do Ministério da Terra e Ambiente a nível central e provincial. O processo de licenciamento envolve duas instituições: o Ministério da Terra e Ambiente, responsável pelo licenciamento ambiental e auditorias, e o Ministério dos Recursos Minerais e Energia, responsável pela concessão mineira e fiscalização.

Foto: Alternactiva- Halaze Manhice

A consultora Impacto apresentou o historial do processo, detalhando os passos seguidos até às consultas públicas e as intenções futuras. Foi revelado que o Ministério dos Recursos Minerais e Energia concedeu cinco licenças de pesquisa à Africa Ocean para a prospecção de minerais em águas rasas da plataforma continental, a partir de 0,6 milhas (1 km) da linha de costa. A pesquisa identificou concentrações de ilmenita e zircão viáveis para mineração comercial.

A empresa solicitou licenças de exploração para minerar cerca de 310 milhões de metros cúbicos de areia numa área de 566 km² do fundo da zona costeira da Zambézia, uma área equivalente a quase duas vezes a cidade de Maputo. O Ministério dos Recursos Minerais e Energia e a Direcção do Ambiente estão a ponderar a concessão destas licenças para uma actividade nunca antes realizada no país e no mundo tão próximo à costa.

O processo incluiu o preenchimento da ficha de informação ambiental, onde a empresa proponente detalhou as formas de operação, infra-estruturas a criar, mão de obra, zona de localização e tipo de vegetação predominante. Esta informação fundamentou a continuidade do processo de submissão do pedido de licença ambiental, originando as primeiras consultas públicas.

Como Será Feita a Operação

A atividade consistirá num processo de dragagem de areias localizadas na água a partir de 0,6 milhas da linha de costa (equivalente a um quilómetro). A dragagem será realizada com recurso a um barco draga propriedade da empresa e o processo consistirá na abertura de crateras em blocos de exploração com profundidades entre 12 e 22 metros, a partir da qual o barco avançará, expandindo a cratera e removendo todo o sedimento do fundo marinho, deixando várias lagoas submersas na zona costeira.  Como forma de remediar o dano, a empresa menciona que fará a devolução dos rejeitos (areia sem interesse e com outra constituição química e física) de forma lenta para tapar os buracos criados.

O barco deslocar-se-á desde o porto de Quelimane, onde será feito o embarque do pessoal e toda a logística necessária para os blocos de mineração. Uma vez no local de interesse, a dragagem será feita de forma contínua, 24 horas por dia, sendo interrompida apenas para reabastecimento.

Criação de Emprego e responsabilidade social

A empresa afirmou que a actividade empregará um máximo de 80 trabalhadores durante os 20 anos de operação. Não prevê criar infra-estruturas logísticas nos distritos contemplados, abastecendo-se totalmente por mar desde Quelimane, evitando assim contacto com os distritos e exportando a matéria-prima diretamente para o mercado asiático.

O relatório não menciona nenhuma estratégia para os afectados directamente. A empresa propõe diálogos futuros para culminar em memorandos de entendimento com os órgãos do governo a nível distrital.

O Parecer e Decisão do Governo

A Direcção do Ambiente apreciou a informação cedida pela empresa e deu continuidade ao processo, categorizando a actividade como de impacto ‘A’, que exige um estudo de impacto ambiental por uma entidade contratada pela empresa.

Pontos Controversos e Problemáticos do Projecto

Uma questão controversa é a não categorização da actividade como de impacto ‘A+’. A Direcção do Ambiente comparou a actividade proposta com outras actividades de mineração já em vigor no país e em terra, alegando que a actividade tem impacto ambiental, mas com níveis de poluição residuais e locais. No entanto, foi reconhecido que esta é a primeira vez que recebem um pedido de licenciamento desta natureza.

O público questionou a categorização com base no Decreto 54/2015, que define actividades de categoria ‘A+’ como aquelas com impactos significativos e irreversíveis que requerem um elevado nível de vigilância social e ambiental, e o envolvimento de especialistas nos processos de avaliação de impacto ambiental. Estas incluem actividades em áreas de importância ecológica significativa, como o mangal e habitats de espécies protegidas..

1) Conflito com Projectos de Conservação

O projecto proposto entra em conflito com outros usos e projectos de conservação em vigor e em perspectiva para a região. A actividade de mineração não é compatível com os planos de gestão e conservação do ecossistema de águas rasas da região, tanto em terra, no que toca à conservação e restauração do mangal, como no mar, onde a zona é crucial para a pesca artesanal, segurança alimentar e fonte de rendimento para a população local, pois a atividade proposta pretende destruir o ecossistema do Banco de Sofala, principal ecossistema de produção pesqueira do país.

2) Risco para Espécies de Tubarões

Um estudo em curso pelo MIMAIP para o monitoramento dos tubarões e raias identificou a praia de Zalala como um importante habitat de berçário para duas espécies de tubarões ameaçadas que utilizam esta praia para o nascimento e crescimento, atestando o seu interesse para a conservação destas espécies em perigo a nível global.

3) Impactos na Economia Pesqueira

A pesca artesanal na Zambézia, responsável pela maior produção pesqueira do país, será diretamente afectada pela mineração. A actividade proposta restringirá o acesso à pesca numa área de 566 km² da costa, impactando a segurança alimentar e a economia local.

Segundo o decreto 54/2015, são definidas como questões fatais os impactos ambientais e/ou sociais negativos irreversíveis de tal significância que a implantação do projecto ou actividade em análise não seja de interesse público.

4) Investimento Questionado

A empresa refere um investimento de 2,6 milhões de dólares por distrito, totalizando 10,4 milhões de dólares. Contudo quando questionada, sobre em que consistirá tal investimento por distrito, a mesma declarou que usará a mesma embarcação para todas as operações, sem criar infra-estruturas locais. Evidenciando a declaração repetida do mesmo investimento em todos os distritos. Quando questionada em consulta, a mesma não se pronunciou sobre o assunto.

5) Envolvimento de Moçambicanos na Pesquisa

Foi revelado que a fase de pesquisa não envolveu Moçambicanos, sendo realizada por uma equipa composta apenas por chineses. Isto é, na fase de pesquisa não houve a participação de moçambicanos a bordo.

6) Violação da Lei do Mar

A actividade proposta não respeitou a Lei do Mar de 2019, que exige a reserva de vagas para um técnico e um cientista moçambicanos a bordo durante a pesquisa. O Ministério dos Recursos Minerais e Energia ignorou esta legislação, validando os resultados apresentados pela empresa sem verificação independente.

Conclusão

Os factos apresentados demonstram várias irregularidades neste processo. Conclui-se que este projecto não tem condições mínimas para ser aprovado, visto que os impactos negativos superam largamente os potenciais ganhos econômicos, não beneficiando a economia do país nem as comunidades locais.

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